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Escolher inimigos

Escolher um inimigo pode ser uma arte, pode-se imaginar um inimigo figadal que nos conhece, é matreiro e competitivo, este inimigo pode ser uma bênção, uma motivação intrínseca, alguém que, pelo seu talento, conduz-nos à excelência, ao ápice das aptidões, um bom inimigo eleva, um bom inimigo é muito mais valioso que um conhecido, um bom inimigo é melhor do que muitos amigos. Um bom inimigo é alguém que é exigente, não admite que desçamos de nível, quer mais e melhor, um bom inimigo é uma excelsa razão para alcançar melhores resultados, ir mais longe, ser mais preciso e acutilante nas acções. Um bom inimigo, como já disse, é uma bênção. 
Os maus inimigos são um desconforto, os maus inimigos são um empecilho, os maus inimigos rebaixam-se, são glutões e venenosos, são criaturas de uma inanidade solene, são criaturas que se comportam como vermes. Os maus inimigos acreditam que o rebaixamento os eleva, não elevam nada, tudo afundam nos seus termos, porque o mau inimigo não tem mestria para nada, o mau inimigo sabe que nunca chegará à glória, a sua alegria é o pântano, chafurdar no atoleiro, o mau inimigo é um cárcere, é a antecâmara da degradação (inevitável, mas que temos o dever de postergar), um mau inimigo é um histrião, um mau inimigo não serve como amigo, um mau inimigo tem maus fígados, mesmo que sonso, tem um pensamento que funciona como uma indigestão. É um circuito para o tremedal, um abismo de vícios. Um mau inimigo não merece uma inimizade, um rasgo de emoção. Um mau inimigo merece desprezo, um distânciamento pela náusea.
Escolher os inimigos é uma arte, faz toda a diferença, é tão importante como os amigos, os amigos não se escolhem, são como família, ficam, permanecem, não partem. Os inimigos são diferentes, a melhor maneira de ler um homem é pelos seus inimigos, quanto melhores estes são, mais valoroso será. Ter inimigos é uma questão de brio, valentia e honradez. Os bons inimigos são sinal de astúcia, perspicácia e inteligência. 

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